Controle da verminose gastrintestinal é essencial para bovinos mantidos em confinamento
21 fevereiro 2022
Nematóides gastrintestinais em bovinos representam sério problema à atividade pecuária. Embora apenas em casos extremos a verminose em bovinos possa causar a morte dos animais, os casos de infecção por esses nematóides podem ser totalmente assintomáticos, apresentar sintomas leves, como desconforto abdominal, e evoluir para casos mais graves, quando os animais apresentam perda de peso, pelos arrepiados, casos de edema, como a ascite, edema submandibular, anemia e diarreia.
O adequado controle da enfermidade por anti-helmínticos com elevada eficácia pode permitir o aumento no ganho de peso, contribuindo para a saúde e bem-estar dos animais, para o aumento da eficiência da produção e na melhora da conversão alimentar. No entanto, se por muito tempo a verminose em bovinos foi bem controlada pelos anti-helmínticos disponíveis no mercado, nos últimos 15 anos a resistência a esses produtos tem se agravado muito.
“O Brasil hoje tem a situação mais crítica em todo o mundo na resistência anti-helmíntica em bovinos. Moléculas que antes controlavam muito bem os parasitas, atualmente têm eficácia próxima a zero”, explica o professor Fernando Borges, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e um dos autores do estudo “Fenbendazole oral em bovinos terminados em confinamento: produtividade e viabilidade econômica”. Realizado no estado do Mato Grosso do Sul com o produto Panacur 10%, em animais cruzados Angus, o estudo foi divulgado em uma importante publicação internacional, o “Journal of Agricultural Studies”.
De acordo com o autor, além da resistência aos anti-helmínticos, entre as causas deste aumento está o uso de algumas raças nos cruzamentos industriais, como por exemplo a raça Angus, que são mais suscetíveis a verminose do que as raças zebuínas, tradicionalmente utilizadas na pecuária de corte. Outro fator que tem contribuído para a proliferação da verminose é o abate de animais cada vez mais jovens, que também estão mais sujeitos à contaminação do que animais com uma idade mais avançada.
Ganho de produtividade
Apesar da incidência de nematóides gastrintestinais em bovinos ter se tornado mais relevante neste cenário do que outras enfermidades, como a infestação de carrapatos, mosca do chifre e até mesmo tristeza parasitária, para o professor da UFMS ainda não há uma boa percepção por parte dos pecuaristas para o aumento do problema da verminose. “Numa boa situação de manejo e nutricional, nós não teremos a verminose clínica. Nós teremos animais que deixam de ganhar peso. E isso é muito difícil de ser percebido. Você olha um animal no confinamento e ele está ganhando peso, está bem, visivelmente saudável. Foi o que nós observamos nesse estudo: os animais do grupo controle, que não receberam nenhum anti-helmíntico, ganharam um peso da forma quase que esperada pelo pecuarista. Só que, espantosamente, com uma simples dose de um anti-helmíntico, esses animais poderiam ganhar cerca de 20 quilos a mais”.
“Foi um resultado surpreendente os animais ganharem 166 gramas a mais por dia e, ao término do estudo, 20,2 quilos a mais em relação ao grupo não tratado”, celebra o pesquisador. O estudo também demonstrou que em qualquer cenário econômico, tanto pessimista, quanto otimista, o tratamento de anti-helmíntico oral de elevada eficácia em bovinos na entrada do confinamento apresentou retorno econômico. “Se você aplica um anti-helmíntico com elevada eficácia, o animal já entra no confinamento sem esses parasitos. Então, desde o início eles já podem aproveitar melhor o alimento e apresentar maior produtividade”, afirma Fernando. “Como esses parasitos podem permanecer nos animais por três, quatro, cinco meses, é interessante então a eliminação desta carga parasitária para que o animal consiga ter melhor desempenho”.
Viabilidade econômica
Além do significativo ganho de produtividade decorrente do aumento de peso do gado tratado com uso de anti-helmíntico oral, o estudo “Fenbendazole oral em bovinos terminados em confinamento: produtividade e viabilidade econômica” também demonstrou a viabilidade econômica deste tipo de manejo. “O que observamos foi um gasto de 0,92 centavos de dólar com o anti-helmíntico e um retorno de 14,6 dólares”, observa o professor da UFMS.
Para ele, a conclusão que pode ser tirada disso é que para obter esse aumento de 20,2 quilos no confinamento sem o uso de um anti-helmíntico de alta eficácia, talvez seja necessário um grande investimento ou uma capacidade técnica muito grande para realizar um ajuste fino na fórmula nutricional desses animais, quando comparado a uma simples aplicação de um anti-helmíntico que vai custar 90 centavos de dólar. “É uma medida muito fácil, muito prática e que deve ser feita em todo o confinamento. Mas esse retorno só foi possível devido a essa eficácia de 99,89% do produto”. O pesquisador ressalta que o retorno econômico ocorre devido à alta eficácia do tratamento, uma vez que estudos realizados no Brasil e em outros países com produtos de baixa eficácia, devido à resistência, não trouxeram retorno econômico.
Pecuária
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Vantagens e desafios
Na avaliação do professor Fernando Borges, a principal vantagem do anti-helmíntico oral é sua eficácia. No estudo conduzido por ele, o medicamento apresentou uma taxa de 99,89% de efetividade. “Uma eficácia tão alta para bovinos, no cenário de resistência anti-helmíntica no Brasil, é uma coisa quase inimaginável”, pontua o autor. Em sua visão, outra vantagem é que a aplicação oral impede possíveis lesões que podem ocorrer na aplicação de produtos injetáveis. E uma terceira grande vantagem: quando o vermífugo é aplicado via oral, ele não apresenta resíduo na carne. “Hoje nós temos alguns aplicadores manuais que são até de baixo custo, ou mecânicos, que exigem um investimento um pouco maior, mas que facilitam muito a aplicação desse produto”, explica.
O professor informa ainda que normalmente esses animais são manejados de forma individual, principalmente na entrada do confinamento, onde são contidos para pesagem, aplicação de algumas vacinas e identificação, o que facilita a aplicação do medicamento. “É um procedimento que, com a equipe treinada, tem o mesmo tempo de duração do que a aplicação de um injetável”.
Para Borges, uma das medidas que pode ser adotada para mudar a percepção por parte dos pecuaristas com relação ao problema da verminose e elevar o controle de nematódeos gastrintestinais em bovinos é contar com uma participação maior dos técnicos nas tomadas de decisão em relação à sanidade dos animais. “Nós observamos nas fazendas de cria, por exemplo, que os veterinários participam muito das etapas reprodutivas da fazenda com os protocolos de IATF, diagnóstico de gestação, exame andrológico, melhoramento animal, pensando em bem-estar animal, além dos técnicos que trabalham com manejo de pastagem e com a formulação da dieta dos animais. Mas nós não vemos nenhum técnico participando das tomadas de decisão de controle de parasito, por exemplo”.
Na visão dele, às vezes é muito mais uma questão comercial, ou tradicional, pois o produtor já tem o costume de adotar um determinado protocolo e usar um produto específico. “Não temos uma receita de bolo que vá resolver o problema de todos os confinamentos do Brasil. Ali tem que ter um técnico, tem que saber fazer o diagnóstico e, o mais importante: entender qual produto funciona contra os helmintos nessa fazenda. Porque nós temos alguns trabalhos no Brasil mostrando que isso pode variar bastante. Há um cenário geral, em que alguns grupos químicos apresentam uma eficácia já muito reduzida, mas caso a caso. Em cada fazenda haverá um perfil diferente de resistência anti-helmíntica”, conclui o pesquisador.